Interessante matéria sobre o resultado do crescimento urbano no espaço indiano. Veja a matéria retirada na íntegra do jornal Herald Tribune:
Nova Déli, entupida, força o crescimento vertical dos prédios
Amélia Gentlemanem Nova Déli
Amélia Gentlemanem Nova Déli
É final de manhã no bairro de Pahar Ganj e as ruas estreitas estão abafadas pelo movimento. Sentados de pernas cruzadas na calçada, quatro homens encadernam livros com couro vermelho; do outro lado da rua, um homem vende romã e cocos frescos; a mulher ao lado compra e vende bolas de gude e peões de madeira; ali perto, um barril cheio de óleo frita gulab jamuns - bolas de massa mergulhadas em calda caramelada.É uma cena muito fotografada pelos mochileiros na Índia, que ficam nos hotéis baratos de Pahar Ganj, ao lado da estação de trem de Nova Déli, no coração da capital. Mas as autoridades da cidade vêem esse pedaço de terra amontoado e vibrante como símbolo de tudo o que há de errado na cidade.Um novo documento do governo, chamado Plano Mestre Déli, propõe que a área seja demolida e substituída por prédios residenciais altos. Déli está explodindo, e a única saída é para cima. Se o plano de Baron Huassman de transformar Paris estava em substituir ruas cheias com avenidas amplas que não poderiam ser bloqueadas, o ministro de desenvolvimento urbano da Índia, Ajay Maken, sonha em criar novo espaço para abrigar a população em expansão crescendo verticalmente.Seu Plano Mestre 2021, que entrou em vigor no mês passado, estabelece diretrizes para transformar a capital da Índia em uma "cidade de classe mundial", guiadas por três prioridades: obliterar as favelas, domar o trânsito e importar o visual de Manhattan. Na superfície, este documento denso, de 200 páginas, cheio de anexos sobre os sistemas de esgoto e ruas que servem de artérias, é um texto seco de linguagem oficial. Mas por baixo das pequenas letras, está uma corajosa tentativa de tratar de um problema urgente: como transformar uma cidade caótica, sufocada pelo trânsito, em uma "metrópole global", que possa representar as ambições indianas de se tornar o próximo superpoder asiático?Como está, Déli é o pesadelo do planejador urbano. Basta ultrapassar a região verde cuidadosamente planejada de Nova Déli, que abriga o primeiro-ministro, a elite da cidade e os melhores hotéis, e encontra-se uma anarquia arquitetônica. O governo estima que cerca de 60% dos 15 milhões de habitantes morem em casas ilegais - em favelas, loteamentos irregulares ou prédios inseguros e sem planejamento.Como essas áreas não existem oficialmente, não têm fornecimento de água garantido, sistema elétrico legal ou esgotos apropriados. Os moradores se viraram: canalizaram a água dos principais dutos e arriscaram suas vidas para fazer gatos de eletricidade para roubar luz.O fornecimento central de água e eletricidade da cidade mal consegue atender a essa demanda extra, invisível, e há interrupções diárias no fornecimento de energia. Como esses assentamentos não foram planejados, nunca receberam boas ruas. Agora seus moradores, que estão ficando rapidamente mais ricos com a explosão econômica da Índia, estão trocando suas bicicletas por motocicletas, ou suas motocicletas por carros. O trânsito da capital está cada vez mais denso e perigoso.O Ministério de Desenvolvimento Urbano concluiu que, se 60% das pessoas na cidade estão morando fora da lei, então o problema está na própria lei. Com um simples movimento da caneta, o novo plano legaliza os imóveis de cerca de 3,5 milhões de pessoas, que até agora viviam com medo de ver suas casas derrubadas. Áreas julgadas perigosas serão reconstruídas, e os dois milhões de favelados da cidade serão remanejados."Para ser uma cidade de categoria mundial, precisamos ter moradias de qualidade", disse Maken em seu escritório em uma parte privilegiada de Déli, onde a falta de energia é rara, e o fornecimento de água é bom.Desde os anos 50, governos sucessivos restringiram a construção de moradias a um departamento, chamado Autoridade de Desenvolvimento de Déli. Mas essa organização não conseguiu manter o ritmo da demanda em ascensão, e, como resultado, os recém chegados à cidade foram forçados a construir ilegalmente.Maken concluiu que o sistema patrocinado pelo Estado se provou desastroso, e o novo plano (o terceiro feito para a cidade desde 1962) permite que incorporadores privados entrem no mercado imobiliário pela primeira vez. Para dar um incentivo a estes incorporadores, o plano abole restrições sobre construções altas em todos os bairros, menos alguns históricos.Construir para cima é uma solução radical para uma cidade na qual restrições de altura mantiveram a maior parte dos prédios no nível das árvores. Mas como o governo não conseguiu deter a chegada anual de cerca de 0,5 milhão de migrantes movidos pela pobreza no campo, alega agora que a ação radical é necessária. Até 2021, estima-se que a capital tenha uma população de 23 milhões, e as massas devem ser abrigadas de alguma forma."Teremos mais espaços abertos e mais prédios altos", diz Maken. "O horizonte da cidade vai mudar. As pessoas não serão mais forçadas a viver em vias estreitas, em condições subumanas. Você não pode converter toda Déli em Manhattan; mas algumas partes vão progredir dessa forma." Déli não tem alternativa, disse ele.Originalmente, Pahar Ganj era um loteamento legal, mas as construções sucessivas tornaram o bairro uma bagunça labiríntica. Os incorporadores agora poderão procurar os moradores, que na maior parte moram em prédios de três andares, e oferecer a eles um apartamento do mesmo tamanho em um bloco de 15 andares e um bônus de, digamos, 2,5 milhões de rúpias (ou R$ 112.000). O plano estipula que 35% das moradias teriam que ser construídas para moradores pobres e espaço verde seria deixado entre os prédios altos.Nada surpreendentemente, o plano é controverso. K. T. Ravindran, diretor da Escola de Planejamento e Arquitetura de Déli, advertiu que a Índia não era culturalmente adequada para arranha-céus. "Você terá comunidades inteiras que não se olham nos olhos, onde o único contato humano é quando gritam com a pessoa no carro do lado".Servindo chá em sua barraca na calçada, Surjit Singh Bedi, 60, disse que não tinha apego sentimental às ruas de Pahar Ganj, que foram seu lar pelos últimos 55 anos. "O que há para gostar?" perguntou, gesticulando para os prédios irregulares, ilegalmente reformados e estendidos sem a ajuda de profissionais. Tradução: Deborah Weinberg
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